26.5.18

Greve dos caminhoneiros: Virtual 3, Real 1

A vida realmente não está fácil para quem é cientista político, colunista sério ou gente um pouco mais esclarecida aqui no Brasil. Tentar esclarecer que a conta da greve dos caminhoneiros será paga com subsídios estatais - e que, indiretamente, toda a população pagará essa conta, seja com aumento de impostos ou com corte de programas governamentais - é totalmente inútil.

O brasileiro que compõe a chamada "opinião pública", devidamente doutrinado por décadas de opiniões enviesadas, do tipo "o Estado não serve para nada" e "tudo o que é bom vem da iniciativa privada", tende naturalmente a apoiar atitudes de segmentos sociais que "sofrem" com a mão opressora estatal. Microempresários (os "pequenos") e caminhoneiros estão nesse grupo.

Daí para apoiar qualquer causa imbecil, é um pulo.

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Resultado natural de nossa tendência a satanizar o governo, a greve dos caminhoneiros é também uma prova de que não sabemos viver no capitalismo de verdade. Oscilações bruscas dos combustíveis, que, no mercado mundial são vistas com naturalidade, aqui foram motivo para que todos, sem exceção, condenassem a Petrobras por ela ter agido como... uma empresa.

Sim, porque uma empresa normal faz exatamente isso que a Petrobras fez. Aumentou o insumo? Repassa os preços ao consumidor final - e mantém os seus custos controlados.

Empresas privadas fazem isso. A Statoil, a grande estatal norueguesa, provavelmente faria o mesmo - já que produzir petróleo custa caro, independente do dono ser o Estado ou um particular.

Com a nossa Petrobras, contudo, tinha que ser diferente. Porque ela é NOSSA.

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Desde sua criação a Petrobras tem sido usada como instrumento do desenvolvimento nacional - e também como anteparo dos preços dos insumos petrolíferos a nível mundial.

Não deixa de ser interessante ter um "fornecedor eterno de combustível barato" - desde que o povo brasileiro entenda que uma empresa assim será eternamente deficitária, condenada a assumir dívidas imensas para garantir (artificialmente) insumos baratos para o consumidor final.

E isso é grave - porque uma empresa assim é um tremendo mico. Nosso mico.

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Convencer o brasileiro a entender que a Petrobras tem que se comportar como uma sociedade de economia mista, entretanto, parece inútil. Faz sentido dizer, contudo, que se o povo, através do Estado, é o acionista majoritário da companhia, é natural que ela aja pela "vontade popular".
Aliás, faz mais sentido ainda dizer que a Petrobras é a cara do brasileiro empreendedor. Boa parte das pequenas empresas vai à falência no Brasil (e outras tantas são pouco lucrativas) justamente porque as pessoas tomam os lucros da empresa como se fossem seus, esbanjando dinheiro que deveria servir para o seu fluxo de casa. Tratando uma pessoa jurídica como extensão da SUA pessoa física.

Depois, quando a empresa definha, e vai à falência, não sabe porque isso ocorreu.

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A conta dessa greve será dividida por todos os brasileiros, mesmo aqueles que acham que as nuvens são feitas de algodão doce - e que não se convencem do contrário, mesmo com todas as provas de que essa conta dos caminhoneiros não será paga pelos privilegiados, mas sim pelo imposto da maioria (sejam pobres, ou da classe média).

Não digam, contudo, que este é um país que leva o capitalismo a sério. Ou queremos um Estado controlando a economia, e "trapaceando" a favor do país, ou aceitamos as regras de mercado - e crescemos, como nação e como povo.

Estamos dispostos a aceitar esse sacrifício? Pelo visto, a resposta é NÃO.

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